Boas vistas

quinta-feira, 21 de abril de 2011

AINDA A PROPÓSITO DO TUA

DESESPERANÇA


Já não sei que mais navios
buscarão este insalubre
litoral nosso desfeito
dentro da própria espuma


Já não sei que mais navios
cortarão na noite intensa
velhas ânsias de chegar
sua renascida pressa


Já não sei que mais navios
virão com carga no ventre
abastecer a distância
interior da minha gente




RIO TUA


Vão as serenas águas deste rio
correndo, e até à foz
tanta vez param.


Talvez solidárias, taciturnas,
talvez em rumor de insurreição.


Se os salgueiros chorassem, como diz
a gesta, meu amor,
o povo chorariam.


Que a barca desce o rio entre linhares,
no vagar da corrente;
mas só a pulso alguém a poderá
fazer subir de novo
as águas quase mansas.


Infunde, ó rio, a líquida dedada,
a marca enorme do que passa devagar
no sal e no fermento do destino
terrestre de quem vive
e morre ribeirinho.


Rio Tua, diz da tua
morna mágoa à flor das pedras.

A. M. Pires Cabral


QUASE EPITÁFIO


O outro sabia.
Tinha uma certeza.
Sou eterno, dizia.


Eu não tenho nada.
Amei o desejo
com o corpo todo.


Ah, tapai-me depressa.
A terra me basta.
Ou o lodo.


Eugénio de Andrade

LINHA DO TUA 2º DIA: Abreiro- Mirandela


SÚPLICA

Rio, que levas o meu sangue ao mar
E no mar o sepultas,
Doira a minha memória.
Conta às ondas e ao vento
A desumana história
Da minha dor.
Que não julguem que tudo se resume
A uma gota de sol e de perfume
Diluída no pó da tua cor.

Miguel Torga

E dos rios houve paisagem e gente e cor. 
Não é o Tua, um rio intocável, mas apenas passível de retoques humanos. Retoques que não destruam o ímpeto do seu leito, a beleza das suas margens, nem a parca comunhão com os homens.  Talvez a barragem possa ser repensada para mostrar que há mais valores que o desenvolvimento, para mostrar que há deuses e que podemos comungar com as suas terras, as suas paisagens.


De Abreiro a Mirandela a paisagem e o rio mudam significativamente. De onde em onde, ainda algum fulgor, alguma agitação, mas a suavidade, o calor, a brandura começa a apoderar-se do olhar e as cores primaveris são intensas.
Este foi o segundo e último dia desta caminhada. A pretensão de fazer Mirandela- Bragança, dependerá da possibilidade em avançar por uma linha abandonada há mais tempo.
Ficam as imagens, sem sons nem odores que aguçariam ainda mais o apetite dos que vêem mais do que apenas um rio, uma linha de caminho de ferro abandonada e pedras inacessíveis.


A famosa ponte rodoviária de Abreiro.

À saída de Abreiro, em direcção a Mirandela.

Os últimos fulgores de um rio esquecido... até há pouco tempo!

A giesta, endémica em Trás-os-Montes.

Isto é um 31!

Lilás.

Urze.

Os primeiros momentos agitados do rio.

Oliveiras na serra.
Represa de Primavera.

Linha em flôr.

Flores na linha a P&B.

A primeira aldeia verdadeiramente junto à aldeia, desde a estação do tua. Para esta gente estará ainda presente Jorge Pelicano e o seu "Pare, escute, olhe".
Há 15 anos, parei e subi ao café. Nunca fui tão bem recebido. Ofereceram-me o almoço, bebidas frescas e uma sombra para descansar dessa outra caminhada de Verão.

Restos do Douro.

Estação da Ribeirinha. Ver o documentário de Jorge Pelicano.

Claridades.

Vinhas com benefícios de luz.

Já 36.

A estação de Vilarinho. A estrada ao lado direito, com mais velocidades.


Só(l)inhas


Diluições do tempo.

Ao Cachão.



Horizonte com limites.

Ahh! Afinal, o chamado "Metro de Superfície" existe ainda, só até ao Cachão.

Mais um quilómetro a cores.

Nostalgia.

Estação de Frechas. Recomposta mas abandonada. Os bilhetes vendem-se a bordo do Metro.

Passagem de nível com guarda moderno e sinais luminosos.

Pequeno túnel de Frechas.

Caminhada para o infinito. 

Vislumbres do rio um pouco mais afastado.








O metro em sentido contrário.



Incongruências. Um mercedes na paisagem. As novas maneiras de viajar.


Afinal o Lódo existe, e este é enorme.





Inclinações finais.

O contentamento do Tiago.


Mirandela.

Aproximação da estação de Mirandela.


Mesmo aqui, a surpresa. A estação está abandonada, violada, e construiu-se um edifício ao lado para servir o metro e as camionetas de transportes rodoviários de passageiros! Nada poderia ser aproveitado??

E o tempo parou! Não sabemos há quanto tempo, porque agora o tempo não parece existir. Ficam ainda as memórias das gentes, como se elas fossem o bastante para fazer fluir os ponteiros inexistentes. É pena!